A grande Pirâmide de vidro

A grande Pirâmide de vidro

Tempo de leitura: 14 minutos

A grande Pirâmide de vidro do Louvre: história, controvérsias e significados.

Projetos ícones de Mitterrand:

François Mitterrand, presidente da França de 1981 até 1995, marcou seus dois mandatos, e a cidade de Paris, com vários projetos inovadores e modernos de construções e renovações arquitetônicas que ficaram conhecidos como: ”A Grande Operações de Arquitetura e Urbanismo” ou “As grandes Obras de Mitterrand” (“Les Grandes Opérations d’Architecture et d’Urbanisme” ou  “Les Grands Travaux de Mitterrand“).

Sua intenção desde no inicio do seu 1° mandato era o mostrar para o mundo, o compromisso da França com relação à arte, a cultura, o patrimônio, seu contexto histórico, politico e social.

As 10 obras mais importantes realizadas e terminadas durante seus 14 anos de vida pública, e que faziam parte de sua propaganda eleitoral eram:

  1. Biblioteca nacional da França (Bibliothèque nationale de France);
  2. Cidade da Música (Cité de la Musique);
  3. Cidade das Ciências e da Indústria (Cité des Science e de l’Industrie);
  4. Instituto do Mundo Árabe (Institut du Monde Arabe);
  5. Ópera Bastilha (Opéra Bastille);
  6. Ministério da Economia e das Finanças (Ministère de l’Économie et des Finances);
  7. Parque da Villette (Parc de la Villette);
  8. Grande Arco da Defesa (Grand Arche de la Défense);
  9. Museu d’Orsay (Musée d’Orsay);
  10. E o que nos interessa aqui, o Grande Louvre, do arquiteto chino-americano, Ieoh Ming Pei (1917-2019).

A grande Pirâmide de vidro:

O projeto desde o inicio foi muito problemático, emblemático e de difíceis soluções, pois o arquiteto tinha como a principal solicitação, a integração do antigo Louvre medieval, renascentista, barroco, clássico, e o neoclássico, com a arquitetura moderna do século XX.

A grande Pirâmide de vidro
Grande Pirâmide de vidro do Louvre. Foto: André Stuckert.

Resumindo a missão: Ieoh Ming Pei tinha que pensar na preservação dos estilos passados e a implantação de uma arquitetura inovadora de alta tecnologia (hight tech), sem quebrar a uniformidade das edificações do seu entorno.

Napoleão Bonaparte I (1804-1814/1815), um pouco antes de se tornar imperador (1804), impressionado com os tesouros e os grandes monumentos que viu durante sua passagem pelo Egito (1789-1801), chegou a pensar em construir uma Pirâmide em frente ao Louvre, mas como foi no final derrotado pelos ingleses, o projeto foi substituído por outras duas construções, que comemoravam somente campanhas vitoriosas:

O pequeno Arco do Triunfo do Carrossel do Louvre, (1807-1809), por sua campanha vencida em Austerlitz, (atual República Checa).

A grande Pirâmide de vidro
Arco do Triunfo do Carrossel do Louvre.
Foto: André Stuckert.

E o grande Arco do Triunfo (1806-1836), na atual praça Charles de Gaulle, (ou Praça Étoile), por todas as campanhas vencidas.

Arco do Triunfo, na Praça Étoile. Foto: Wikimedia Commons.

O arquiteto Ieoh Ming Pei:

Ieoh Ming Pei, arquiteto sino-americano, nascido em 26 de abril de 1917 na cidade de Guangzhou (China) e falecido em 16 de maio de 2019 em Nova Iorque (EUA) teve como mestre Walter Gropius (1883-1969), fundador do Bauhaus, escola de arte alemã que marcou a história do design, da arte moderna, fotografia, arquitetura, o paisagismo, o urbanismo e a dança entre 1919 e 1933.

Ieoh Ming Pei (1917-2019).

Suas realizações são caracterizadas pela busca de uma certa pureza das formas (geralmente geométricas) combinadas com eficiência funcional, incluídas no pós-modernismo clássico.

Utilizava nas suas obras, materiais frios, como a pedra, concreto, vidro e o aço. Realizou um grande número de projetos em todo o mundo, entre arranha-céus e museus.

O edifício Leste, da Galeria Nacional de Arte, em Washington (D.C.) projetado por ele, foi que chamou a atenção do presidente François Mitterrand para realização do “Grande Louvre”.

Galeria Nacional de Arte em Washington (D.C.). Foto: Wikipedia Commons.

Recebeu importantes recompensas ao longo da sua carreira, sendo a mais importante em 1983, o Prêmio Pritzker, equivalente ao Prêmio Nobel da Arquitetura. Logo após esse prêmio, foi que começou a trabalhar no projeto da Pirâmide e o Grande Louvre. Talvez seu mais famoso projeto.

Significados:

O arquiteto Ieoh Ming Pei deu continuidade a essa antiga vontade de Napoleão, mas com outra simbologia e finalidade. Para ele, a construção da Pirâmide foi uma forma de homenagear os grandes construtores do passado mostrando ao mundo a evolução das técnicas, e dos materiais construtivos no decorrer do tempo.

Tomando como modelo a Pirâmide de Quéops, no Egito, Ioh Ming Pei baseou-se para dar forma na sua grande Pirâmide de vidro, usando aos mesmos ângulos e proporções em escalas reduzidas.

Comparação aproximada entre as Pirâmides do Egito e do Louvre.

Um maneira de se fazer um paralelismo entre o presente e o passado, a história como experiência, estudo e aprendizado, mostrando assim ao mundo, a evolução dos conhecimentos, das técnicas, e da inteligência dos homens.

Pirâmide de Quéops, (Gizé), Egito. Foto: Wikipedia Commons.

Simbolicamente a Pirâmide para os egípcios era considerada um monumento funerário destinado a conservar o sarcófago de um faraó ou sacerdote, que acreditava na continuidade da vida num mundo além-vida, e que o homem comum, sem os conhecimentos sagrados, nunca teria o acesso ou a chave do pós vida.

Imagem 3 D. Câmaras funerárias na Piramide de Quéops, (Egito).

Para o americano Dan Brown que escreveu o famoso livro “Código da Vinci”, a Pirâmide do Louvre teria 666 painéis de vidro, simbolizando um número satânico, e o principio masculino, o “Falo(ou Fálus).

Relata ainda que o principio complementar feminino, se encontra na Pirâmide Invertida (subterrânea), chamada por ele, de “Cálice”.

A grande Pirâmide de vidro
Pirâmide invertida do Louvre. Foto: Tom Pavesi

A união dos dois sexos, o Falo e o Cálice, representam as dualidades do universo: o Yin e Yang , o Céu e Terra, o Fogo e Água, o Corpo e Alma, o Dia e a Noite, o Sol e a Lua… Enfim, havia todo um mistério de fatos fictícios e verídicos, relatados durante o desenrolar da estória do livro.

Cena do filme “O Código da Vinci”, com o ator Tom Hanks.

Para Ming Pei, como um adepto da medicina chinesa, onde maquetes de pirâmides são usadas no tratamento de vários problemas de saúde, como: no combate a dores de cabeça, problemas cardíacos, infecções, cortes, feridas… E outros.

Imaginou portanto que todo visitante ao entrar pela grande Pirâmide do Louvre, com a mente aberta e com plena de vibrações positivas, a pessoa receberá atreves desse canal, forças energéticas diretamente do universo (cósmico), juntamente com as forças telúricas (terrestre), garantindo a ele, uma abertura na consciência, apto ao descobrimento de novos conhecimentos e novas experiências, idealmente importantes para se aprender viver no presente com inteligência e sabedoria.

Ieoh Ming Pei, arquiteto da Pirâmide do Louvre.

Pensando num significado mais filosófico, Ming Pei, utilizou técnicas modernas para a construção da Pirâmide, misturando modernidade, inovação e tradição, conseguiu deixar uma forte identidade da sua maneira de pensar arquitetura, e de um estilo que será sempre lembrado como referência da arquitetura do século XX, e que entrou para história do Louvre, na mesma forma que os arquitetos dos antigos reis.

A busca completa para a “Eternização das Artes“.

Controvérsias:

A grande controvérsia sobre a construção da Pirâmide foi causada pela mídia, e muitos opositores indignados do presidente François Mitterrand ter escolhido Ieoh Ming Pei, arquiteto chino-americano, sem abrir uma concorrência internacional.

Na verdade, François Mitterrand, aproveitou-se de um artifício legal da regras urbanas de Paris, onde Ioh Ming Pei foi contratado somente como consultor do arquiteto encarregado da “renovação” do Grande Louvre.

Um bela jogada do presidente, que deu autonomia ao arquiteto para redesenhar o novo Louvre e a liberdade para projetar uma nova proposta de entrada aos visitantes do museu. Concretizado mais tarde com a Grande Pirâmide de vidro.

A grande Pirâmide de vidro
Pirâmide do Louvre em construção em 1987. Foto: Joseolgon

Na reunião de apresentação do projeto para a “Comissão superior dos monumentos históricos, realizado em 23 de janeiro de 1984, os membros conservadores tiveram um momento de espanto e de indignação quando foi mostrado os detalhes da Pirâmide e das renovações internas do “Grande Louvre”.

Os debates foram quentes e agressivos contra o arquiteto, que insistiam em dizer que projeto era muito futurista, que estava fora do contexto da arquitetura clássica do Louvre (como foi julgado em seu tempo a Torre Eiffel ou o centro Pompidou), e outras questões técnicas e de estética.

Ming Pei recebeu os piores comentários nacionalistas e extremistas que poderiam se fazer contra um estrangeiro.

A grande Pirâmide de vidro
Ieoh Ming Pei e sua maquete da Pirâmide do Louvre.

Mas ele, forte no seu caráter e protegido pelo presidente, continuou expondo suas ideias e suas explicações simbólicas e técnicas, sem se preocupar com as polêmicas dos seus opositores.

No final da reunião, Ieoh Ming Pei conseguiu por unanimidade a aprovação do projeto, sendo que dos 49 membros da Comissão, 36 votaram a favor e 13 contra.

Depois dessa reunião, o projeto saiu nos principais jornais da França, o que aumentou ainda mais a pressão e polêmicas contra o arquiteto e sua ideias faraônicas ou “disneylantesca” (disneylandia+grotesca), mas com já estava aprovado e justificado, as críticas e outras explicações, ele deixou para o presidente, ministros e assessores em responder.

Em 2006, ao 89 anos, ele declarou o seguinte:

Ce que beaucoup de gens n’ont pas compris, c’est que la pyramide n’avait pas grande importance. Le plus important, c’est d’avoir unifié le musée. Auparavant, il y avait sept départements, des conservateurs qui se battaient. Mon travail a permis de créer un grand musée, le plus beau du monde. J’en suis très fier.

Tradução Livre:
O que muitas pessoas não entenderam é que a pirâmide não tinha grande importância. O mais importante é ter unificado o museu. Anteriormente, havia sete departamentos, conservadores que lutavam (por espaços). Meu trabalho permitiu a criação de um grande museu, o mais bonito do mundo. Estou muito orgulhoso.

Composição da Pirâmide:

Ieoh Ming Pei projetou uma construção totalmente envidraçada e transparente. Um “diamante” bruto talhado no vidro. Uma verdadeira joia da arte moderna.

A grande Pirâmide de vidro
Grande Pirâmide do Louvre. Foto: David McSpadden

Com uma base quadrada de 35, 24 m de lado e 21,64 m de altura, destaca-se como uma miniatura fiel da Pirâmide de Quéops, em Gizé. O projeto foi tanto faraônico em sua construção quanto em sua tecnicidade.

Sua grande funcionalidade foi a criação de uma acesso de entrada central, pelo Pátio (Cour) Napoleão, ao museu mais vistado do mundo, organizando o fluxo de vistantes para aos 14.5 km de corredores e as 403 salas de exposições.

A fabricação do “Vidro Diamante”, como foi chamado pela empresa francesa Saint-Gobain foi realizada num forno elétrico de última geração construído especialmente para se reduzir os óxidos de ferro e a incidência do verde na transparência.

Foram necessários meses de pesquisa para desenvolver este vidro laminado extra-branco, de 21,52 mm de espessura, dividido em duas folhas de 10 mm coladas por quatro filmes de Polivinil butiral usadas como segurança.

A grande Pirâmide de vidro
Detalhe estrutural do vidro da Pirâmide do Louvre. Foto: Jean-François Gornet.

Oferecendo assim propriedades mecânicas excepcionais, de perfeita qualidade óptica, e transparente como como encontrados em óculos de visão.

As placas de vidro da Grande Pirâmide estão espalhados numa superfície aproximada de 1.800 m², composto de 673 painéis de vidro, sendo 603 em forma de losangos (2,9 x 1,9 m) e 70 em forma de triângulos equiláteros (base 1,90 m).

A grande Pirâmide de vidro
Grande pirâmide do Louvre e as três pequenas. Foto aérea: France Télévision.

Contando com as três outras pequenas pirâmides que se encontram ao redor da Grande Pirâmide. O total passa a ser 793 painéis de vidro, sendo 675 em forma de losangos e 118 triângulos. Um quebra-cabeças estrutural bem complexo.

Fabricado pela empresa Saint-Gobain Vitrage France exigiu a construção de um forno especial reduzindo os óxidos de ferro e sua incidência verde na transparência.

Placa comemorativa dos 30 anos da Pirâmide do Louvre (29 de março de 2019).
793 “éclats” (estilhaços).

Sua estrutura pesa 95 toneladas, com uma inclinação de 51°, altura de 21,64 metros, e uma base quadrado de 35,24 metros.

Grande Pirâmide do Louvre. Foto: Vladimir Bazan.

Embaixo da Pirâmide, dentro do hall Napoleão é de se notar que a cor escolhida para pintura das paredes internas e no teto, é de um tom ocre, a mesma cor das fachadas externas dos edifícios, uma maneira bem pensada para integrar o novo com o velho Louvre.

Interior da Pirâmide do Louvre. Foto: Tom Pavesi.

Ao contrário que pensavam os faraós e Dan Brown, ela simboliza a vida. Apesar de todas as críticas que ainda recebe, se tornou a 3° obra mais visitada e fotografada do museu, perdendo somente para a Mona Lisa, e a Vênus de Milo. Hoje, ninguém imagina o Louvre sem sua Pirâmide de vidro.

Outro detalhe, a escada em forma helicoidal de acesso do público (para pessoas que não gostam de escadas rolantes) é mais uma referência de Ieoh Ming Pei, que tinha com os valores do passado, ao copiar um vestígio medieval encontrado durante as escavações para ampliação do novo Louvre, chamada “La Grande Vis” (O grande parafuso).

A grande Pirâmide de vidro
Escada helicoidal de Ieoh Ming Pei, referência a escada medieval ,”La Grande Vis”.
Foto: Gregory Bastien

Abaixo, vestígios da escada de acesso ao antigo Palácio do Louvre de Carlos V (1364-1380), encontrado durante escavações da “Cour Carré”, entre 1984 e 1986.

A grande Pirâmide de vidro
Base do “Le Grande Vis” (no circulo vermelho). Foto: Tom Pavesi.

Inauguração da Pirâmide por Mitterrand:

Inaugurada em 04 de março de 1988, pelo presidente da república, François Mitterrand, juntamente como o Ministro da Cultura da época, François Léotard, e arquiteto Ieoh Ming Pei.

Inaugurada pelo 2° vez, de novo pelo presidente Mitterrand, em 29 de março de 1989 foi aberta ao público em 01 de abril de 1989.

Gostaria de fazer uma visita guiada comigo pelo Louvre ou outros locais de Paris ? Então clique no botão abaixo para mais informações ou no botão do Whatsapp para um contato mais dinâmico. Até breve! Tom Pavesi!

Nota: Agradecimento especial para o fotógrafo Diego Cogo, pela foto da capa.

Fontes:

  • “Le Grand Louvre, du donjon à la pyramide”, de Catherine Chaine et Jean-Pierre Verdet (Ed. Hatier, 1989).
  • “La Grande histoire du Louvre”, de Georges Poisson (Ed. Perrin, 2013).
  • “La pyramide du Louvre”, de Francoise Mardrus (Ed. El Visio, 2019).
  • Site “Louvre.fr”.

6 Comentários


  1. Excelente artigo! Muito esclarecedor sobre a pirâmide de vidro. Gostei muito.
    Parabéns!

    Responder

  2. TOM PAVESI
    TU E ÓTIMO ADOREI
    PARABÉNS
    EU ADORO APRENDER
    MUITO BOM
    MARION CERATTI
    14 DE JULHO 2020. PELA DATA
    OBRIGADO

    Responder

  3. Como sempre um relato interessante e completo. Parabéns, sou sua fiel seguidora,

    Responder

  4. Sensacional!
    Muito interessante conhecer a história desse monumento e suas controvérsias!
    Parabéns pelo artigo!!!

    Responder

  5. Encantada com a reportagem. Quando voltar a Paris certamente a verei com mais profundidade.

    Responder

Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *